Entrevista
Durante o XIV Congresso Brasileiro e II Congresso Internacional de Odontopediatria a presença de ten Cate foi destaque. O chefe do Departamento de Odontologia Preventiva da Universidade de Amsterdan e editor chefe da revista Caries Research, foi entrevistado por Yvonne Buischi para o Jornal da ABOPREV.
ABOPREV: A escovação dental seria um fator importante
para a redução de cárie observada nos últimos
anos?
ten Cate: Há um bocado de dados da li-teratura, mostrando
que a remoção de placa através da escovação
não resulta em redução significativa de cáries,
particularmente porque a placa das fissuras e da região proximal
não é removida pela escovação. Uma revisão
interessante feita por Ann Scheie de Oslo mostra que a escovação,
como tal, não resulta em menor número de cáries.
ABOPREV: Este declínio de cárie deve ser então
atribuído ao uso de dentifrícios fluoretados?
ten Cate: O que posso dizer é que o decréscimo
da prevalência de cárie ocorre paralelo à introdução
dos dentifrícios, mas é claro, outras coisas também
mudaram. Houve um aumento da preocupação com os problemas
associados à cárie dental. As pessoas ficaram mais interessadas,
mas se tem mostrado que ainda se usa muito açúcar e muitas
bactérias estão presentes na boca, o que causa cárie.
Combinando estes fatores, acredito que os dentifrícios fluoretados
sejam a causa principal do declínio de cárie.
ABOPREV: Em crianças que já escovam os dentes
com dentifrícios fluoretados, e não ingerem água fluoretada,
há necessidade de suplemento de flúor?
ten Cate: Dizemos na Holanda que é inútil utilizar
comprimidos de flúor logo após a escovação
com dentifrício fluoretado. A escovação dental, 2
vezes ao dia, com dentifrício com flúor deve ser suficiente.
Por outro lado, pode-se dizer que as crianças freqüentemente
se esquecem de escovar os dentes, mas este fato nos levaria a questionar
se elas iriam se lembrar de utilizar outros métodos, como comprimidos
ou bochechos. Em grupos de alto risco, no entanto, ainda recomendamos aplicações
tópicas profissio-nais.
ABOPREV: É possível reduzir a concentração
de flúor nos dentifrícios e manter a eficiência?
ten Cate: Duas concentrações são usadas
para adultos: 0,1% (1000 ppm) e 0,15% (1500 ppm) e ambas são efetivas,
talvez com uma pequena diferença, sendo a maior concentração
levemente mais efetiva. Nós temos trabalhado com dentifrícios
para crianças com 1/4 da concentração indicada para
adultos, ou seja 250 ppm. Estudos recentes, realizados na Islândia,
têm mostrado que estes dentifrícios são um pouco menos
efetivos, mas, se a criança ingerir o dentifrício, terá
menor chance de desenvolver fluorose. De qualquer modo, estamos agora considerando
a possibilidade de aumentar a concentração de fluoreto nos
dentifrícios infantis de 250 ppm para 500 ppm. Alguns dados dos
EUA, acho que um estudo do Ripa, e também um de Mitropoulos da Inglaterra,
mostram diferença entre as concentrações de 250 e
1000 ppm. Se a concentração de 250 ppm é ou não
suficiente depende também do incremento de cárie. Em um país
onde a cárie é uma doença de alta prevalência
ou em uma população de maior risco, eu provavelmente usaria
uma concentração de 500 ppm para crianças.
ABOPREV: A concentração mínima de fluoreto
em um dentifrício deveria ser, portanto, de 500 ppm?
ten Cate: Não há razão para se reduzir
a concentração de flúor em dentifrícios usados
por adultos. Para crianças, sim. Mas seria mais interessante se
enfatizássemos o uso de pequenas quantidades de dentifrício.
Acho que é mais importante usar menos dentifrício, o que
seria muito mais econômico.
ABOPREV: NaF é realmente superior ao MFP?
ten Cate: Comparando todas as informações clínicas,
parece que o NaF é levemente melhor que o MFP, mas há várias
coisas que devem ser levadas em consideração. Nem todo o
dentifrício com NaF que tem sílica como abrasivo é
melhor, porque a fabricação do dentifrício com NaF
é mais complicada e dispendiosa. Um outro fator é que vários
outros aditivos que têm sido colocados nos dentifrícios fluoretados
só funcionam com MFP. Num país como o Brasil, com alta incidência
de cárie, é mais importante assegurar que se tenha um produto
compatível, que as pessoas o usem de forma correta e que você
possa dizer aos pacientes para não enxaguar completamente a boca
após a escovação. Esses fatores e a relação
custo benefício são mais importantes que as questões
acadêmicas sobre que produto é mais eficiente.