FLÚOR NO SAL?
Jaime A. Cury
Enquanto no mundo desenvolvido já se discute o futuro dos métodos
sistêmicos, no Brasil ainda estamos debatendo se devemos adicionar
flúor ao sal ou à água. Como ambos são métodos
de saúde pública para prevenção da cárie
dentária, é impossível que não se façam
comparações entre eles, mesmo porque a utilização
de um exclui o uso do outro. Por isso, não é surpresa que
este assunto seja tratado com tanta paixão. O primeiro aspecto a
ser levantado é a importância atual destes métodos
na prevalência de cárie dentária. Até pouco
tem-po atrás a agregação de flúor ao trata-mento
de água reduzia em aproxima-damente 50% o índice de cárie
de populaçóes. Entretanto, dados recentes mostram que, em
virtude do declínio de cárie observado no mundo, as diferenças
de cárie dental entre uma cidade com e outra sem água fluoretada
reduziu-se para valores da ordem de 20% ou menos. Assim, a importância
dos métodos sistêmicos passou a ser questionada, porque a
redução de cárie tem sido atribuída a outra
forma de usar flúor, já sendo considerada de saúde
pública, que é o uso de dentifrício fluoretado.
Em se tratando do Brasil, em prin-cípio concluiríamos
que dependemos ainda de flúor na água ou no sal. Na realidade,
estes métodos ainda são importantes para o nosso país,
mas dados animadores de 1992 mostra-ram que a diferença de CPOD
(12 anos) entre escolares da rede pública de cidades da região
sudeste de São Paulo, Piracicaba com água fluoreta-da há
mais de 20 anos e Limeira (ainda não beneficiada), é da ordem
de 26%,sugerindo estar havendo também no Brasil um declínio
de cárie.
Assim, conclui-se que estes métodos ainda são importantes
para o país do ponto de vista de saúde pública, embora
venham a ter um menor impacto que no passado.
Para a utilização de qualquer método coletivo
de uso do flúor deve-se discutir que:
-
em princípio, fluoretação da água de abastecimento
público seria o método mais indicado para regiões
com populações essencialmente urbanas, que tenham estação
central de tratamento. Procura-se assim atender o aspecto de cobertura,
além de ga-rantir a melhoria da qualidade de vida, via saneamento
básico. O que não se pode admitir são atitudes de
indife-rença ou de conivência frente aos problemas com a fluoretação
da água, pois para prescrevermos suplementos de flúor, necessariamente
temos que saber se o mesmo está presente na água em forma
natural. Por outro lado, se sabemos que a fluoretação de
nossa cidade não anda bem e nada fizermos, estaremos sendo coniventes
com a situação. Infelizmente, isto tem prevalecido
no Brasil, com exce-ções como a do colega Walter Valquez
Clavera, de Jaraguá do Sul, SC, que, de posse de resultados ina-dequados
de fluoretação da água de sua cidade, procurou as
autoridades locais para esclarecimentos, sendo advertido pela iniciativa
de enviar as amostras de água para serem analisadas. Clavera não
se intimidou e, exercendo seu direito de cidadão, está fazendo
uma verdadeira vigilância comunitária na sua cidade;
-
para cidades sem estação central de tratamento de água
de abastecimento público e/ou maioria da popula-ção
em zona rural, a fluoretação do sal seria um método
alternativo, des-de que fossem observa-dos os requisitos:
-
todo o sal de consumo humano teria que ser fluoretado para que o mé-todo
atingisse seus objetivos, em termos de saúde pública. Particular
atenção deve ser dada ao sal consumido pelas pessoas de menor
poder aquisitivo, pois se este não for fluoretado, o método
não atingirá seu benefício social. Vale lembrar que
a camada social de maior poder aquisitivo é atualmente beneficiada
pela escovação com dentifrício fluoretado;
-
o sal fluoretado não deve ser consumido em regiões com flúor
natural na água, onde as concentrações forem superiores
a 0.5ppmF-, o que garatiria a segurança em termos de fluorose dental;
-
a concentração de flúor no sal deveria levar em conta
que somos um país continental, conside-rando os aspectos regio-nais,
se a dose 250mgF-/Kg poderia ser nacionalizada.
Frente a estas considerações técnicas, passaríamos
para às de ordem política. O Brasil não suporta mais
o jogo de interesses de pessoas, ou de grupos, em relação
ao benefício da população. Portanto, não se
trata de flúor no sal ou na água. Os caprichos têm
que ser deixados de lado. Não importa se fomos os autores da idéia,
devemos defendê-la se ela atender aos interesses da população.
O episódio do flúor no sal não é recente, começou
há mais de 10 anos. Porém, à semelhança do
que tem acontecido no Brasil, em outras áreas, o processo tem sido
boicotado de ambas as partes. Por omissão, quando os defensores
de um método não são seus proponentes, ou sendo solapado
pelos oponentes quando os adeptos de tal método o propôe.
Quem ganha ou perde com este confronto? Com certeza a população.