RUI V. OPPERMANN
A redução na prevalência de cáries juntamente com o envelhecimento da população dos países industrializados tem renovado o interesse da odontologia sobre a questão periodontal. Tanto um maior número de dentes presentes como um maior tempo de manutenção dos mesmos na boca determinam problemas periodontais crescentes na população. Mesmo que, sob o ponto de vista epidemiológico, nos últimos anos se tenha revisto a questão da prevalência e severidade da doença periodontal, ainda cerca de metade da população adulta americana sofre de doença periodontal do tipo destrutiva e cerca de metade desta população perde dentes por problemas periodontais.
Dados epidemiológicos geralmente não são de interesse imediato do clínico, principalmente quando ele está frente a pacientes seus que apresentam doença periodontal e demandam tratamento. Por outro lado, o profissional engajado numa prática de promoção da saúde bucal preocupa-se em oferecer a seus pacientes, independente da idade, uma atenção que garanta a saúde periodontal inclusive para aqueles que ainda não apresentam sinais de des-truição periodontal.
A terapêutica periodontal se beneficiou enormemente do conhecimento científico gerado nas últimas décadas, orientando o tratamento para o controle da causa das doenças periodontais, que é a placa bacteriana. O reconhecimento de que as doenças periodontais são de natureza infecto-inflamatória condicionou o tratamento periodontal a medidas eficazes para o controle da placa bacteriana. Inúmeros estudos longitudinais têm repetido incessantemente que o sucesso de qualquer intervenção no periodonto está condicionado a um efetivo controle da placa bacteriana pelo binômio paciente-profissional.
Pouco, contudo, tem servido o conhecimento científico para implementar medidas mais eficazes de prevenção da doença periodontal. Parece claro o consenso de que um adequado controle da placa supragengival é ainda a forma mais adequada de tratamento das gengivites e prevenção das periodontites. Assim colocada, a questão parece bastante simples, porém a sua implementação na prática sofre limitações bastante sérias, pois exige uma universalização de medidas de higiene, cujas limitações, sejam de natureza local, cultural ou sócio-econômica impedem a elevação dos níveis de auto-cuidados quer do indivíduo quer da coletividade.
O conjunto de conhecimentos produzidos a respeito do papel das bactérias no estabelecimento e progressão das doenças periodontais destrutivas tem apontado para possíveis estratégias alternativas ao modelo clássico de prevenção que é ba-seado no "limpe o quanto puder e ainda um pouco mais". A clássica associação entre severidade da periodontite e higiene oral encontrada na população tem sido revista principalmente quando a unidade de observação não é mais o conjunto populacional, mas o indivíduo separadamente. Além disso, a compreensão de que os periodontopatógenos associados à destruição periodontal se encontram na placa subgengival, a qual é inacessível aos procedimentos de higiene bucal do paciente, contribui para que se reavalie a necessidade de padrões de limpeza universais. Adicionalmente, fatores de resistência locais e gerais, que se diferenciam de indivíduo para indivíduo podem contribuir para esclarecer por que pacientes com níveis semelhantes de higiene bucal podem apresentar quadros distintos de destruição periodontal. O estabelecimento e progressão da periodontite, que é diferente de indivíduo para indivíduo, como o clínico sabe reconhecer muito bem, pode estar associado ao resultado da modulação entre bactérias presentes na área subgengival e o conjunto de defesas locais e gerais que o indivíduo apresenta. Conseqüentemente, a necessidade e intensidade do controle da placa bacteriana tanto supra como subgengivalmente é dependente do resultado da interação entre bactérias subgengivais e resistência do indivíduo. Desta forma é possível que indivíduos suscetíveis devem merecer maior atenção e apresentar melhores níveis de auto-cuidados do que indivíduos resistentes.
Está implícito nesta conceituação que um dos principais papéis do clínico é o de diferenciar os grupos suscetíveis a fim de prover cada um deles de atenção adequada sem incorrer no risco de um sub- ou sobretratamento.
O desenvolvimento de procedimentos clínicos e/ou laboratoriais que permitem a diferenciação desses dois grupos de pacientes tem sido objeto de inúmeras pesquisas. A maioria das propostas ainda são de limitado valor ou aplicabilidade clínica. Embora não reste dúvida de que eventualmente procedimentos desta natureza venham a ser desenvolvidos no futuro próximo, ainda temos que nos contentar com o diagnóstico clínico que, apesar de suas limitações, tem reconhecida eficácia.
O diagnóstico de atividade de doença periodontal destrutiva é o primeiro e principal instrumento na busca de uma efetiva prevenção da periodontite. Perda de inserção principalmente em níveis incipientes, aliado ao sangramento e/ou supuração à sondagem peridontal compõem o quadro de alerta para o clínico desencadear medidas profiláticas e preventivas. Qua-dros dessa natureza podem ser detectados em populações já na faixa etária dos 9-12 anos como demonstrado em escolares de Porto Alegre, aumentando ainda mais as responsabilidades dos profissionais que trabalham em saúde coletiva bem como dos odontopediatras. A inexistência de sondas periodontais no armamentário de exame desses colegas é imperdoável.
A efetiva prevenção da des-truição periodontal
nesses pacientes é alcançada com procedimentos de fácil
execução e grande eficácia, como por exemplo, a raspagem
e alisamento radicular subgengival. O monitoramento permanente dos pacientes
é a garantia de manutenção da saúde periodontal.,
pois permite não só reforços na motivação
para os auto-cuidados como também controle da infecção
subgengival.
RUI V. OPPERMANN é Professor Titular de Periodontia da UFRGS